amorim lima
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ALINE MARIA PACFICO MANFRIM
CONTRIBUIES DO CONCEITO PRTICAS DE LETRAMENTO PARA A COMPREENSO DO USO E DO SENTIDO DA LNGUA MATERNA NA ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL AMORIM LIMA
CAMPINAS 2013
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM
ALINE MARIA PACFICO MANFRIM
CONTRIBUIES DO CONCEITO PRTICAS DE LETRAMENTO PARA A COMPREENSO DO USO E DO
SENTIDO DA LNGUA MATERNA NA ESCOLA MUNICIPAL DE ENSINO FUNDAMENTAL AMORIM LIMA
Orientadora: Profa. Dra Raquel Salek Fiad
Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obteno do ttulo de doutora em Lingustica Aplicada, na rea de Lngua Materna.
CAMPINAS 2013
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FICHA CATALOGRFICA ELABORADA POR CRISLLENE QUEIROZ CUSTODIO CRB8/8624 - BIBLIOTECA DO INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM - UNICAMP
M313c
Manfrim, Aline Maria Pacfico, 1978-
Contribuies do conceito prticas de letramento para a compreenso do uso e do sentido da lngua materna na Escola Municipal de Ensino Fundamental Amorim Lima / Aline Maria Pacifico Manfrim. -- Campinas, SP : [s.n.], 2013.
Orientador : Raquel Salek Fiad. Tese (doutorado) - Universidade Estadual de
Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem. 1. Letramento. 2. Prticas discursivas. 3. Lngua
materna. 4. Anlise do discurso. 5. Liberdade. I. Fiad, Raquel Salek, 1948- -. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Ttulo.
Informaes para Biblioteca Digital
Ttulo em ingls: Contributions concept of "literacy practices" for understanding
the use and meaning of language in the Municipal School of Basic Education Amorim Lima. Palavras-chave em ingls:
Literacy. Discursive practices. Native language. Discourse analysis. Liberty. rea de concentrao:. Lngua Materna. Titulao: Doutora em Lingustica Aplicada. Banca examinadora: Raquel Salek Fiad [Orientador] Renilson Jos Menegassi Guilherme do Val Toledo Prado Sylvia Bueno Terzi Graziela Lucci de Angelo Data da defesa: 21-02-2013. Programa de Ps-Graduao: Lingustica Aplicada.
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Dedico este trabalho a duas pessoas importantes na minha vida: Gladis Maria de Barcellos Almeida por me apresentar ao mundo cientfico contribuindo para que eu encontrasse um caminho profissional e Joo Wanderley Geraldi por mostrar que possvel priorizar o humano no universo acadmico.
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Agradeo pelo acolhimento, apoio e respeito por quem sou e pelas minhas escolhas:
Pai (Jos Carlos Manfrim) e Me (Ktia Pacfico Manfrim)
Sforah Marina Pacfico Manfrim e Amanda Liz Pacfico Manfrim
Leonardo Perticarrari
Alexandre Tcito Malavolta, o grande amor da minha vida
Juliano, meu amigo e sujeito de pesquisa do mestrado
Queridas Lgia Balista, Laura Muller, Larissa Higa, Fernanda DOlivo,
Melissa Lopes e Isabel Silveira, Mariana Lima
Raquel Salek Fiad
Ana Fonseca de Almeira
Corinta Grisolia Geraldi
Marlia Gabriela Malavolta
Milene Bazarim
Tereza Salvi
Romulo Augusto Orlandini
Lgia Martins Orlandini
Hlio Paje
Rafael Borges
Carlos Turatti
Cristiane Andrade
Renata dos Humildes Oliveira
Moacir Lopes de Camargos
Alice Campos Canedo
Jos Alberto Canedo
Filipe Augusto Maia Perez
Silvana Schwab
Gabriela Rigoti
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No quero ser triste
Como o poeta que envelhece
Lendo Maiakvski
Na loja de convenincia
No quero ser alegre
Como o co que sai a passear
Com o seu dono alegre
Sob o sol de domingo...
Nem quero ser estanque
Como quem constri estradas
E no anda
Quero no escuro
Como um cego tatear
Estrelas distradas
Quero no escuro
Como um cego tatear
Estrelas distradas...
(Zeca Baleiro)
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Resumo
Frente a um (auto) discurso de liberdade presente na Escola Municipal de Ensino
Fundamental Amorim Lima, localizada na capital paulista, este trabalho tem como
meta compreender, a partir das reflexes proporcionadas pelos Novos Estudos do
Letramento, como este discurso considerado nas aes que se centram nas
prticas de leitura e escrita da lngua materna. A partir de uma pesquisa qualitativa
de teor interpretativista conforme as especificidades da investigao em
Lingustica Aplicada, um estudo de caso foi realizado para a gerao dos registros
necessrios a esta verificao. A postura terica adotada considerou as reflexes
do Bakhtin e seu Crculo para auxiliar na compreenso das respostas que a escola
oferece quando seleciona o material a ser desenvolvido pelos alunos no que se
refere Lngua Portuguesa. Os resultados da pesquisa, a partir do agrupamento
do material compilado na pesquisa de campo, mostram que o discurso da
liberdade se efetiva em alguns momentos da escola, mas, no que se refere ao
trato com a lngua materna, ele se distancia pelo fato de as prticas de letramento
estarem vinculadas a um modelo autnomo de letramento. Por ser a primeira tese
que prope investigar a Amorim Lima a partir do ponto da Lngua Materna, houve
a necessidade, mesmo que se tenha realizado um trabalho de contextualizao
situada da escola, de fazer algumas generalizaes. Entretanto, elas so
necessrias para o prprio andamento das pesquisas cujo enfoque centralizar
nas prticas de letramento desta escola por ser um ponto de partida a partir de um
trabalho de campo.
Palavras-chave: Prticas de letramento, letramento autnomo, letramento
ideolgico, lngua materna, liberdade.
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Abstract
Faced with an (auto) speech of freedom in the Municipal School of Elementary
Education Amorim Lima, located in the capital of the state of So Paulo, this study
aims to understand, from the reflections offered by the New Literacy Studies, how
this speech is considered in the actions which are focused on practices of reading
and writing the mother language. From a qualitative study of interpretativist content
according to the specificities of the investigation in Applied Linguistics, a case
study was conducted to generate the necessary records to this verification. The
theoretical stance adopted considered Bakhtin and his Circles reflections to assist
in understanding the responses that the school offers when selecting the material
to be developed by students in relation to the Portuguese. The surveys results,
from the grouping of the material compiled in field research, show that the speech
of freedom is effective at school sometimes, but regarding to the dealing with
language, it distanced itself because the literacy practices are linked to an
autonomous model of literacy. As the first thesis that proposes to investigate
Amorim Lima from the point of Mother Tongue, it was necessary, even if one has
done a job of contextualizing located at school, to make some generalizations.
However, they are necessary for the proper progress of studies whose focus will
center on literacy practices of this school, because it is a starting point from the
field work.
Keywords: Literacy, Discursive practices, Native language, Liberty.
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Rsum
Bas dans un discours de soi mme de libert presente dans lcole municipal
d`ducation lmaintaire Amorin Lima, localize dans la ville de So Paulo, ce
travail a la finalit de comprendre, pour les rflexions proportionnes par les
Nouveaux tudes du Littratie, comme ce discours est consider dans les actes
qui se centrent sur les pratiques de lecture et de criture de la langue maternelle.
partir d` une recherche qualitatif intrpretatif, conforme les spcificits de
linvestigation de la Linguistique Aplique, un tude de cas a et ralis pour la
production des dons ncessaires cette vrification. La perspective thorique
adopte a considr les rflexions de Bakhtin et de son Circle pour aider dans la
comprehension des rponses que l cole offre quand elle slectionne le matriel
de langue portugaise qui sera dvelopp par les tudiants. Les rsultats de la
recherche, partir du groupement du matriel compil dans la recherche de
champ, montrent que le discours de la libert se donne dans qualques moments
de l`cole, mais, en ce qui concerne le traitement de la langue maternelle par
l`cole, il se distance parce que les pratiques de Littratie sont lies un modle
autonome de Littratie.
Pour tre la premire thse qui propose une recherche de l`Amorim Lima partir
de la langue maternelle, il y a eu la besoin, malgr la ralisation d`un travail de
prsenter le contexte situ de l`cole, de faire quelques gnralisations. Pourtant,
elles sont ncessaire par le propre dveloppement de las recherches dont le but
centralisera dans les pratiques de Littratie de cette cole pour tre un dbut
partir d un travail de champ.
Mots-cl: Pratiques de Littratie; littratie autonome, littratie Idologique, langue
maternelle; libert.
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Sumrio
INTRODUO ..................................................................................................................... 1
O QUE EST EM JOGO .................................................................................................... 17
A EMEF DESEMBARGADOR AMORIM LIMA ................................................................. 19
PRTICAS DE LETRAMENTO E O TRABALHO COM A LNGUA MATERNA NA
EMEF AMORIM LIMA........................................................................................................ 57
METODOLOGIA E A CONFIGURAO DO OBJETO DE PESQUISA .......................... 73
RESULTADOS E PRINCIPAIS ANLISES DOS REGISTROS GERADOS PELA
PESQUISA DE CAMPO/ESTUDO DE CASO ................................................................... 81
LETRAMENTO AUTNOMO EM UM DISCURSO DE LIBERDADE ......................... 135
CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 141
REFERNCIAS ................................................................................................................ 145
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Lista de Quadros
Quadro 01 Princpios de Convivncia................................................................ 31
Quadro 02 Exemplo de Roteiro......................................................................... 33
Quadro 03 Exemplo de Ficha de Finalizao.................................................... 36
Quadro 04 Exemplo de Relatrio Quinzenal..................................................... 38
Quadro 04 Caracterizao da EMEF Amorim Lima baseado no panorama
apresentado por Mizukami (1986)......................................................................... 87
Lista de Esquemas
Esquema 01 Lista de livros da EMEF Amorim Lima.......................................... 39
Esquema 02 Padro de resposta...................................................................... 39
Esquema 03 Recorte descritivo das Oficinas de Lngua Portuguesa.............. 113
Esquema 04 Dinmica de interao professor-aluno no Salo de Estudos ... 114
Lista de Tabelas
Tabela 01 Prticas de Letramento na EMEF Amorim Lima............................... 82
Tabela 02 Reagrupamento da Tabela 01 em relao ao suporte/lugar e relaes
sociais.................................................................................................................... 88
Tabela 03 Lista dos Roteiros por idade...................... .................................... 101
Tabela 04 Roteiros diretamente relacionados ao trabalho com Lngua Materna..... 107
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Introduo
A preocupao em se compreender o papel da escola nos dias de hoje
necessria. Barbosa (2004) defende que esta instituio se prope a assumir o
compromisso com a educao consolidando-se como o principal cenrio do
processo educativo, mesmo no sendo o nico lugar onde as pessoas se educam.
Admitindo, ento, o lugar privilegiado do escopo educativo, cabe ressaltar tambm
seu papel ideolgico.
Barton (2007) destaca que o ponto importante da educao escolar a
leitura e a escrita. Dessa forma, a escolarizao parte do cenrio de estudos do
letramento1. Este autor ainda aponta que, apesar de ser parte e no a totalidade
dos estudos do letramento, a escola consome grande parte da vida das crianas e
se configura como uma referncia significativa para a construo dos valores e
atitudes que vivenciaro nas prticas sociais de que participarem.
Esta forte referncia da escola continua na maioridade e quando estas
crianas se tornarem pais, fazendo, assim, com que os valores escolares entrem
nas casas. O pesquisador ainda detalha que muitas prticas so aprendidas na
escola: as crianas aprendem a obedecer, a ser parte de grandes grupos, a
permanecer sentadas, a serem reguladas pelo tempo, mas a parte central dessa
organizao o uso da linguagem2.
Barbosa (2004) tambm destaca ainda que h alguns questionamentos
que devem ser considerados quando se quer compreender os desafios da escola
no contexto atual tais quais: qual a concepo dominante presente na escola,
como se identifica, na prtica, o discurso educacional e quais movimentos so
realizados na prtica educativa para que o aluno se depare com a realidade de
forma crtica.
1 O conceito de letramento ser mais profundamente discutido juntamente com o conceito de prticas de
letramento, em seo posterior nesta tese. 2 Realizei aqui uma espcie de traduo parafraseando o contedo da pgina 176 e 177 da obra de Barton
(2007).
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Tomando como base a reflexo desta autora, esses questionamentos
podem revelar a funo ensino na escola e, consequentemente, que trabalho
realizado para que ideologia se efetive, valores estes que podem tender ao ensino
que reproduza a excluso social que existe na dinmica capitalista e nas relaes
de trabalho sociais ou para uma educao transformadora que estimule o senso
crtico do aluno, fazendo com que ele perceba que necessrio, no contexto
atual, o compromisso com a mudana histrica voltada para a sociedade
democrtica.
Os estudos sobre a ergonomia do trabalho, quando dizem respeito ao
ensino, apontam que uma questo interessante a ser considerada como um
professor constri um meio de trabalho que possibilite a adeso de um grupo de
alunos a realizar uma determinada tarefa.
Souza-e-Silva (2004) defende, nesta perspectiva ergonmica, que o
trabalho ensino pode ser compreendido como um amlgama
prescries/realizaes sobre o qual constitudo e evolui. Em suas palavras, a
abordagem ergonmica considera que a ao simultaneamente uma resposta s
prescries, mas tambm uma questo a elas endereada. (p. 95)
Utilizando o conceito de gnero social do ofcio, esta mesma autora, em
consonncia com a perspectiva terica a qual ela se filia quando cita Clot e Fata,
faz uma aluso ao conceito de gneros do discurso estudado por Bakhtin (1979)3,
compreendendo o ensino como uma rede de relaes de valores culturais que,
entrelaados, constituem uma relativa unidade que o caracteriza. Da possvel
3 Bakhtin (1979) utiliza o conceito de gneros do discurso para se referir s maneiras de uso da lngua
compartilhadas nas esferas sociais quando produzimos enunciados. Para este autor, os gneros so meios de viabilizao dos enunciados que queremos proferir de modo que nas interaes humanas se leva em conta qual o melhor gnero a ser utilizado para garantir a efetividade do dilogo uma vez que, para utilizar aqui os conceitos deste prprio autor, o tema a ser enunciado est necessariamente atrelado com a estrutura composicional do gnero selecionado como mais vivel comunicao e, tambm e com o mesma fora, o estilo do gnero, possibilitando mais ou menos o aparecimento do estilo individual de quem enuncia quando o seleciona. Associada a esta proposta de considerar os gneros do discurso com as prticas sociais de comunicao humana, este autor defende que a escolha do gnero tambm determinada pelo fato de sempre enunciamos algo respondendo antecipadamente ao que entendemos que nossa alteridade (o outro) espera de ns no processo comunicativo. Nesse sentido, nem a escolha do gnero aleatria e nem as escolhas relacionadas ao tema so descomprometidas em uma situao de comunicao.
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compreender melhor a relevncia em considerar, por um lado, as prescries
relativas a este ofcio de ensinar e, por outro, a realizao do mesmo.
Desse modo, a concretizao do ensinar , assim como Bakhtin
considera o enunciado em um gnero, uma resposta ao prprio gnero a partir
tanto da individualidade do sujeito que age quanto da representao do papel
profissional que esta pessoa escolhe reforar. A autora ainda afirma que
Clot e Fata propem ento olhar a atividade real como uma atividade que se realiza entre duas memrias uma pessoal (meu ofcio) e a outra impessoal (o ofcio dos outros). Alm das prescries, o ofcio tem para cada trabalhador uma dupla vida. A
atividade seria, ento, o teatro permanente de um movimento em duas direes opostas: estilizao dos gneros e variao de si. (SOUZA-E-SILVA, 2004, p. 99).
Os estudos sobre a ergonomia do trabalho podem, ento, deslocar a
compreenso do papel da escola hoje para um lugar de reflexo que envolve
muito mais os sujeitos envolvidos (uma vez que consideram a constituio do
tempo e espao de trabalho prescrio/realizao) do que a instituio escolar
enquanto entidade generalizante.
Essa postura terica frutfera para a reflexo sobre a escola porque
conceitos como trabalho, instituio e sociedade no se delimitam somente
enquanto unidades duras desassociadas da atuao das prprias pessoas que
atuam nesse universo. Ento, quando o intuito discutir o papel da escola, h que
se considerar, alm das respostas s prescries enraizadas pela histria, o
trabalho educacional que os profissionais da educao apresentam quando
realizam esta funo.
Um dos lugares de verificao dessas respostas e do trabalho humano
o currculo, no sentido abordado por Silva (1999). Para este autor, o currculo
um discurso que delimita uma representao da realidade e, a partir desta
delimitao, selecionado qual conhecimento produzido pela herana cultural
ser abordado e como ser abordado, podendo revelar, assim, o motivo pelo qual
os alunos devem ser educados no processo de escolarizao.
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Nesse movimento de compreenso das respostas produzidas no
trabalho escolar para a relao entre ensino, instituio e sociedade, Morin (2003),
por outro lado, aponta ser necessrio considerar que vivemos hoje na era
planetria, momento no qual necessrio nos conscientizarmos de que, para
alm da globalizao, vivemos em uma relao de totalidade complexa
fsica/biolgica/antropolgica com o planeta Terra.
Esse ponto de partida tenta romper com a postura fragmentada de
entendimento do cenrio global em que vivemos e revela a emergncia do papel
de educar engajado com a realidade desta era planetria, voltada para a
identificao da sociedade enquanto participante do mundo.
Para ele,
A misso da educao para a era planetria fortalecer as condies de possibilidade da emergncia de uma sociedade-mundo composta por cidados protagonistas, conscientes e criticamente comprometidos com a construo de uma civilizao planetria. [...] O ensino tem de deixar de ser apenas uma funo, uma especializao, uma profisso e voltar a se tornar uma tarefa poltica por excelncia, uma misso de transmisso de estratgias para a vida. (MORIN, 2003, p. 98)
Os pontos tratados acima pelo autor so considerados por ele
fundamentais para o objetivo da educao que seria fortalecer as atitudes e as
aptides dos homens para a sobrevivncia da espcie humana e para o
prosseguimento da hominizao (idem, p. 100). Isso implica considerar o futuro,
inserido na relao viva com presente e passado, como finalidade.
Diante das compreenses citadas acima a respeito da funo da escola
(seja por considerar o papel da escola, pelo trabalho de ensinar, pelo currculo
e/ou pelo objetivo da educao) um eixo sempre considerado: atribui-se
socialmente escola o papel de contato, ensino e aprendizagem da herana
cultural que se consolidou na histria do conhecimento humano.
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Fica destinada escola, ento, a tarefa de fazer com que o aluno
aprenda a construir uma relao com o conhecimento considerado base para se
interagir com o mundo. Diante disso, a ao de aprender tem um lugar garantido
na organizao da escola, independente de sua proposta de ensino. Dessa forma,
o que difere na relao entre a proposta de ensino (currculo) e a aprendizagem,
como j considerou Silva (1999), o que a instituio escolar visa na
escolarizao, sendo possvel retomar tambm aqui os questionamentos j
lanados por Barbosa (2004) citados no incio deste captulo.
Atrelada a esta identificao de que as escolhas feitas pela escola,
frente ao processo educativo, interferem nas formas de tratamento da herana
cultural necessrio considerar ainda que a discusso sobre diversidade inseriu-
se tambm no universo escolar, revelando, assim, a necessidade de uma postura
que considere a intrnseca relao entre conhecimento, poder (j prevista para o
currculo crtico) e, tambm, identidade, conceito tratado por Silva (1999), como j
pertencente a outro tipo de currculo: o ps-crtico.
A teoria denominada ps-crtica ganhou destaque na discusso a
respeito do currculo devido s prprias reformulaes sociais, em termos de
ressignificao de valores, no que se refere ao conceito de diferena, no sentido
de assumi-la enquanto realidade e que deve ser respeitada principalmente na
esfera educacional.
No caso da realidade brasileira, especificamente no campo
educacional, algumas exigncias atuais contriburam para enraizar esse discurso,
tais como:
A heterogeneidade de alunos que as escolas apresentam devido
Constituio de 1988 que torna legal a democratizao do ensino no que se
refere obrigatoriedade do oferecimento da educao bsica a todos por
parte do pas, a princpio projetadas para um pblico de classe social mdia
e alta, a qual preparou e criou seus filhos com acesso ao conhecimento em
consonncia com o processo de escolarizao;
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A diversidade das realidades escolares brasileiras, contextualizada
conforme o corpo docente, corpo discente, a localizao, as condies de
trabalho, a atuao da comunidade do entorno e a relao com os rgos
administrativos educacionais;
A discusso sobre incluso de alunos especiais e as condies de
viabilizao de um trabalho para lidar com tal realidade mais voltado ao
ensino regular, conforme prev a Lei de Diretrizes e Bases da Educao
Brasileira (Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996);
O espao de trabalho com a noo de cultura e identidade a partir da Lei
que obriga o ensino de cultura africana na escola (LEI N 10.639, DE 9 DE
JANEIRO DE 2003);
O fortalecimento e relevncia do conceito de bullying na atualidade
como mecanismo de no aceitao da diferena4;
A divulgao de vdeos governamentais sobre homossexualismo
voltado principalmente s escolas pblicas, mais recente ao
governamental que ainda est em processo de aceitao pelos
profissionais da educao5.
A compreenso de aprender, inserida na discusso que envolve
reconhecimento da heterogeneidade e atuao do trabalho educacional, mobiliza-
se no sentido de auxiliar a repensar justamente qual a relao que uma escola
deve ter com a aprendizagem, uma vez que precisa atender s exigncias
nacionais e a demanda social do pblico que a constitui. Os prprios Parmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) voltados ao Ensino Fundamental II, foco desta
pesquisa, publicados em 1996, j admitiam este contexto educacional:
4 A rejeio s diferenas um fato descrito como de grande importncia na ocorrncia de bullying. No
entanto, provvel que os autores escolham e utilizem possveis diferenas como motivao para as agresses, sem que elas sejam, efetivamente, as causas do assdio (LOPES NETO, 2005, S167). 5 Material que ficou conhecido como kit anti-homofobia produzido e distribudo pelo Ministrio da Educao
(MEC) em 2011. Trata de homossexualidade e composto por uma cartilha e trs vdeos, voltado aos alunos do Ensino Mdio.
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No contexto atual, a insero no mundo do trabalho e do consumo, o cuidado com o prprio corpo e com a sade, passando pela educao sexual, e a preservao do meio ambiente so temas que ganham um novo estatuto, num universo em que os referenciais tradicionais, a partir dos quais eram vistos como questes locais ou individuais, j no do conta da dimenso nacional e at mesmo internacional que tais temas assumem, justificando, portanto, sua considerao. Nesse sentido, papel preponderante da escola propiciar o domnio dos recursos capazes de levar discusso dessas formas e sua utilizao crtica na perspectiva da participao social e poltica. (p. 27) [...] Para tanto, necessrio que, no processo de ensino e aprendizagem, sejam exploradas: a aprendizagem de metodologias capazes de priorizar a construo de estratgias de verificao e comprovao de hipteses na construo do conhecimento, a construo de argumentao capaz de controlar os resultados desse processo, o desenvolvimento do esprito crtico capaz de favorecer a criatividade, a compreenso dos limites e alcances lgicos das explicaes propostas. Alm disso, necessrio ter em conta uma dinmica de ensino que favorea no s o descobrimento das potencialidades do trabalho individual, mas tambm, e sobretudo, do trabalho coletivo. Isso implica o estmulo autonomia do sujeito, desenvolvendo o sentimento de segurana em relao s suas prprias capacidades, interagindo de modo orgnico e integrado num trabalho de equipee, portanto, sendo capaz de atuar em nveis de interlocuo mais complexos e diferenciados. (p. 28)
Isso implica em, uma vez assumindo a diversidade cultural, regional,
fsica e sexual, decidir at que ponto se pode pensar, no que se refere ao papel da
escola, em aspectos genricos (administrativos, oficiais, organizacionais) em
relao aprendizagem e, tambm, aspectos especficos (dinmica do
funcionamento escolar). Junto a essa problemtica, agora no que se refere
elaborao do currculo, vale destacar a questo de como conviver com a
realidade de que todo conhecimento trabalhado em sala de aula no neutro.
Dessa maneira, estes modos todos de os envolvidos com a escola
lidarem com as possibilidades e os limites dessa instituio esto diretamente
ligados s decises e posturas assumidas pelas escolas quando vivenciam o
processo de escolarizao. Isso significa que, diante dessa postura, muitos
aspectos se consolidam: o papel do professor, o modo de trabalho com o
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conhecimento, a relao com o material didtico, a organizao espacial da
escola, a relao de envolvimento com os pais, o espao autorizado que o aluno
possui na escola e, a organizao progressiva do conhecimento a ser trabalhado
nas sries ainda, a prpria avaliao.
Geraldi (2010) mobiliza o conceito de aprendizagem quando apresenta
modos (consequentemente duas aes distintas) de compreenso para este
conceito, dependendo da forma como se concebe a herana cultural (os
conhecimentos produzidos e compartilhados por uma sociedade). Para isso, ele
parte do seguinte questionamento, j considerando o trabalho educacional como o
ensino do futuro:
Como nos definimos nesta relao com a herana cultural? Passado o tempo das escolas dos sbios, o modo de relao com a herana cultural, por ns hoje recebida, no campo das cincias, como um conjunto de disciplinas a filosofia, a lgebra, a geografia, a histria, a literatura, a qumica, a fsica, a matemtica... a de no produtores de cultura, mas de sujeitos que dela se apropriam, especialista em uma das gavetas/disciplinas. Por longos anos estudamos as disciplinas que nos ensinada; por longos anos vamos s fontes disciplinares e aprendemos mais do que nos ensinado: estamos prontos, mas no acabados. (p. 17) [...] Creio que h necessidade de invertermos a flecha nesta relao. A herana cultural continua disponvel, mas ela deve ser entendida como de fato : no apenas um conjunto de disciplinas cientficas, mas um conjunto de conhecimentos e saberes. (p. 18) [...] O ensino do futuro no estar lastreado nas respostas, mas nas perguntas. com as mos cheias de perguntas que melhor nos orientamos no manuseio da herana cultural. O que importa aqui que as perguntas dirigem a seleo, construo ou reconhecimento da inexistncia de respostas. Creio que o ensino tem dado respostas a alunos que no conhecem as perguntas. Temos aprendido respostas sem sabermos as perguntas que a elas conduziram. (p. 19)
Entendo que aprender a fazer perguntas envolve considerar alunos
como sujeitos aptos e autorizados a levar suas dvidas no nvel da investigao
intelectual, assim como grandes pesquisadores, artistas e pensadores,
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configurando-se, desta forma, a assuno da heterogeneidade enquanto parte
constitutiva da escola no prprio planejamento educacional. Essa postura leva os
alunos a aprender a aprender6 e no simplesmente apreender um conhecimento
enquanto produto final.
Lidei, no mestrado7, com a angstia de me deparar e investigar, por
meio de estudo de caso, um sujeito que no tinha seu lugar na escola que
estudava e, justamente por no se enquadrar, foi reprovado vrias vezes e no
era considerado um bom aluno pelos professores, o que me levou a questionar
que escola poderia lidar com essa diversidade a ponto de no bloquear a
capacidade deste aluno de dizer no ao que a escola lhe propunha8.
Este ponto de partida me fez buscar uma reflexo mais madura a
respeito das representaes de uma boa escola para a sociedade. A partir de
minha experincia como professora na Educao Bsica em escola pblica e
particular, alm de ministrar aulas em universidade pblica e particular e do fato
de ter sido aluna tanto em escola pblica (Ensino Fundamental e Ensino Superior)
quanto em particular (Ensino Mdio), fao as seguintes ponderaes e busco a
compreenso delas em alguns estudos. So elas:
a. A sisudez um modelo de bom comportamento e bom resultado.
Neste ponto, possvel compreender, com o auxlio dos estudos de Aris
(1960), que, por meio da histria social da criana e da famlia, modelos de
bom comportamento foram valorizados, principalmente depois da Idade
Mdia, com a educao religiosa e disciplinadora, com base na moral. Mais
interessante ainda o fato de esse valor da disciplina ser um forte critrio
para avaliar uma boa educao no sculo XXI.
b. A valorizao da avaliao um medidor de aprendizagem.
6 Aprender a aprender: Sugesto proposta por Wanderley Geraldi em uma gentil e atenciosa conversa sobre
esta tese, no ms de maio de 2011 (Baraqueaba-SP). 7 MANFRIM, A. M. P. Enunciados escritos: relaes dialgicas entre gneros discursivos. Dissertao de
Mestrado. IEL-Unicamp, 26/06/2006. 8 Lo que convierte a un animal en humano es la capacidad de ser sujeto, la capacidad de decir . No hay
sujeto sin valores o ideales que negar. Toda subjetividade se funda en una ruptura. (Jess Ibez).
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A avaliao serve para generalizar e chegar a resultados estatsticos
possveis de viabilizar aes de poltica educacional nacional interligadas
mundial. Assume-se um discurso comparativo com ndices mundiais e, a
partir disso, a necessidade de enquadramento, por mais sufocante que
parea ser, torna-se foco principal e competitivo, assim como nos moldes
da competio capitalista pelos lucros (bnus, prmios etc.).
c. evidente a desvalorizao do sujeito (como consequncia de b).
Devido proposta generalizadora da educao na escola, tanto no que se
refere ao ensino quanto aprendizagem, inserido na ideologia do
enquadramento, o pensamento da ateno individualizada no valorizada
porque, para a manuteno do prprio processo, necessrio que haja
pessoas que, nessa viso, fracassem. Nessa lgica, a subjetividade no
tem lugar e, muitas vezes, considerada como atraso para o grande
rendimento do grupo (sucesso). Nas palavras de Morin (2003), preciso
devolver o papel ativo quele que havia sido excludo por um objetivismo
epistemolgico cego. preciso reintroduzir o papel do sujeito
observador/computador/estrategista em todo conhecimento. O sujeito no
reflete a realidade. O sujeito constri a realidade. (p. 37)
d. H insegurana, na esfera escolar, ao que considerado no
convencional9. Justamente pelo enraizamento da concepo
essencialmente rgida no tratamento do conhecimento, ou a escola se
enquadra e faz o seu trabalho ou no faz. Essa a razo de haver, ainda,
9 Utilizo aqui a caracterizao no convencional para me referir s formas de educao escolares que Moacir
Gadotti chama de educao no formal. Para ele, Toda educao , de certa forma, educao formal, no sentido de ser intencional, mas o cenrio pode ser diferente: o espao da escola marcado pela formalidade, pela regularidade, pela sequencialidade. O espao da cidade (apenas para definir um cenrio da educao no formal) marcado pela descontinuidade, pela eventualidade, pela informalidade. A educao no formal tambm uma atividade educacional organizada e sistemtica, mas levada a efeito fora do sistema formal. Da tambm alguns a chamarem impropriamente de educao informal. So mltiplos os espaos da educao no formal. Alm das prprias escolas (onde pode ser oferecida educao no formal) temos as Organizaes No-Governamentais (tambm definidas em oposio ao governamental), as igrejas, os sindicatos, os partidos, a mdia, as associaes de bairros, etc. Na educao no formal, a categoria espao to importante como a categoria tempo. O tempo da aprendizagem na educao no formal flexvel, respeitando as diferenas e as capacidades de cada um, de cada uma. Uma das caractersticas da educao no formal sua flexibilidade tanto em relao ao tempo quanto em relao criao e recriao dos seus mltiplos espaos. (GADOTTI, 2005, p. 02)
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11
poucos modelos autorizados e reconhecidos de escolas diferentes. A
pergunta que fica s voltas dessas propostas diferentes de lidar com o
ensino e a aprendizagem aprende-se ou no? e o esforo dessas
escolas em provar que pode funcionar de outra maneira grande. Isso
acontece porque, ao propor algo diferente, se lida com a relao entre uma
estrutura de trabalho educacional e avaliao desse trabalho que tende a
ser quebrada.
Feitas essas consideraes, possvel verificar que a concepo de
uma boa escola pode estar ainda muito voltada para o rendimento apresentado
nas avaliaes oficiais que valorizam um tipo de conhecimento e forma de lidar
com ele muito voltado ao modo como as classes mais privilegiadas valorizam a
construo e a transmisso da herana cultural, dinmica escolar que data o
perodo anterior obrigatoriedade do ensino, mostrando que ainda no est
pronta para lidar com a heterogeneidade e a nova realidade do sculo XXI.
Como objetivo geral, esta tese visa dar espao e discutir uma escola
que, inicialmente, percebeu a necessidade de uma nova proposta educacional que
respondesse a uma aprendizagem (papel atribudo escola, como foi discutido
anteriormente) vinculada ao que decidi nomear de discurso da liberdade.
No link A escola10, inserido no site da EMEF Amorim Lima, o primeiro
texto que aparece o poema de Rubem Alves:
H escolas que so gaiolas. H escolas que so asas. Escolas que so gaiolas existem para que os pssaros desaprendam a arte do vo. Pssaros engaiolados so pssaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode lev-los para onde quiser. Pssaros engaiolados sempre tm um dono. Deixaram de ser pssaros. Porque a essncia dos pssaros o vo. Escolas que so asas no amam pssaros engaiolados.
10
http://antigo.amorimlima.org.br/tiki-index.php?page=Escola%20-%20Hist%C3%B3ria
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12
O que elas amam so os pssaros em vo. Existem para dar aos pssaros coragem para voar. Ensinar o vo, isso elas no podem fazer, porque o vo j nasce dentro dos pssaros. O vo no pode ser ensinado. S pode ser encorajado.
(Rubem Alves)
Atrelado metfora do voo, este (auto)discurso ainda agrega uma
concepo de espao educacional voltado s heterogeneidades, o que me fez
associar, antes da experincia da pesquisa de campo que realizei nesta escola,
um carter democrtico, muito prximo do que Freire (1997) caracteriza como
educao libertadora na qual, superada a contradio entre educador e educando,
configura-se um comportamento de estar sendo com as liberdades e no contra
ela (FREIRE, 1997, p. 72).
Outra associao que me permiti fazer frente a este (auto)discurso foi a
de haver uma coerncia entre a proposta de viabilizar um processo educacional
pautado na liberdade e o trabalho com a lngua materna. A meu ver, a coerncia
se evidenciaria se eu identificasse, na investigao das prticas de letramento
existentes na Amorim Lima, atividades que envolvem a leitura e a escrita voltadas
ao que Street (1995) define como modelo de letramento ideolgico, isto , aquele
que parte do pressuposto de que os significados que so atribudos leitura e
escrita nas prticas de uso desta escrita so culturais e, assim, prescindem de
relaes de poder estruturadas e reforadas pelo grupo social que pertencem.
Este modelo ideolgico de letramento serve no para, referindo-me
novamente s palavras de Paulo Freire, depositar uma forma de lidar com a
escrita como a educao bancria pretende, mas entender que a escrita, tal como
ela praticada, serve tambm para contextualizar o sujeito no mbito dos valores
importantes para as relaes sociais das quais participa.
Configuradas as minhas hipteses a respeito do que encontraria na
Amorim Lima e o critrio cientfico de seleo da mesma como objeto de estudo
(os discursos produzidos sobre a escola na mdia e na sociedade), houve a
necessidade do cumprimento dos seguintes objetivos especficos:
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13
i. Investigar, a partir das prticas de letramento reconhecidas por mim
nesta escola, como se caracterizam as situaes concernentes
Lngua Materna e se elas acompanham o discurso de liberdade
sinalizado pela instituio;
ii. Esclarecer o que autorizado e o que marginalizado nas escolhas
que so feitas para se utilizar a linguagem nesta escola;
iii. Investigar as prticas seleciona como importantes e a que
grupo/comunidade elas favoreceriam;
iv. Compreender a reorganizao de espao-tempo relacionada ao
trabalho docente.
A partir dos objetivos especficos, pretendo:
- defender a importncia das novas formas de organizao escolar
como respostas ao nosso tempo atual e, com isso, discutir a relao entre sujeito,
informao e conhecimento que vivemos no sculo XXI, mostrando novas
organizaes de espao-tempo no que se refere aos lugares de aprendizagem
no sc. XXI. Alm disso, compreender como est sendo possvel, atualmente, a
existncia dessas formas diferentes de escolarizao.
- discutir qual a relao que esta instituio estabelece com a
constituio da liberdade, com cumprimento dos contedos, desenvolvimento do
trabalho educacional.
Considerando a diversidade de estudos referentes educao e
escola, pode parecer sem sentido uma proposta de estudo e reflexo referente a
uma escola, uma vez que todas possuem suas particularidades.
A pesquisa foi delineada por meio das seguintes etapas: compilao de
materiais diversos sobre a escola (site da escola, reportagens sobre a escola,
livros sobre a escola), pesquisa bibliogrfica acadmica sobre a escola (teses e
dissertaes), pesquisa de campo/estudo de caso (realizados em 2010 no perodo
de 2 meses), gerao dos registros relevantes para a anlise e discusso dos
resultados.
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14
Os resultados mostram que a reorganizao de espao, tempo e da
dinmica escolar da EMEF Amorim Lima contriburam muito para que os alunos se
sentissem autorizados a participar do processo posicionando-se frente todas as
questes referentes escola e, tambm, para a participao forte dos pais no
cotidiano escolar.
Entretanto, no que diz respeito Lngua Materna, perceptvel que
todas as atividades relacionadas a ela remetem ainda ao discurso que a
Sociolingustica denomina de preconceituoso a respeito da linguagem ( possvel
at destacar 2 dos 8 mitos que BAGNO (2002) prope quando investiga a
mitologia do preconceito lingustico, que os Novos Estudos do Letramento11
classificam como letramento autnomo, que os estudos sobre gneros textuais
designam como ensino gramatical dos gneros.
Apesar de esta tese identificar na EMEF Amorim Lima um carter
convencional e bem conhecido do tratamento da lngua materna nos estudos
brasileiros, a pesquisa torna-se relevante porque evidencia que uma proposta para
o trabalho com o portugus envolve questes muito mais amplas a serem
consideradas, que perpassam alteraes visveis na dinmica escolar.
O conceito de autonomia para fazer a ponte entre escola e a vida
precisaria estar mais atrelado concepo de lngua materna que tivesse como
base a compreenso de que o uso da linguagem um espao de negociao
efetivo e no s de exposio das opinies e da escolha de qual roteiro comear a
estudar. Alm disso, os espaos de aceitao e autorizao da autonomia no
deveriam se restringir queles fora do cumprimento das tarefas escolares como
assembleias, orientaes de estudos e oficinas culturais, mas tambm e
principalmente no exerccio cotidiano de uso da linguagem.
A ttulo de organizao, esta tese apresentar a seguir as motivaes
da pesquisa, na seo O que est em jogo mostrar uma descrio interpretativa
sobre a Amorim e depois discutir a importncia do conceito prticas de
letramento para este trabalho. Posteriormente, descrever a Metodologia utilizada
11
Estudos sobre letramento tratados em captulo posterior nesta tese.
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15
na pesquisa, apresentar os resultados juntamente com as anlises e depois
concluir o trabalho, trazendo, nas consideraes finais, ideias que podem ser
inferidas aps a realizao da pesquisa.
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O que est em jogo
A escolha pela EMEF Amorim Lima para ser o centro de minhas
reflexes deu-se a partir das seguintes consideraes:
a. Uma pergunta no respondida no final do mestrado12.
Ao investigar, por meio de estudo de caso, dois sujeitos, um considerado bom
e outro considerado ruim pela professora de portugus, fiz, no mestrado, uma
discusso de quanto o aluno bom se dedicava a responder s expectativas
da professora e o quanto o aluno ruim, por no se preocupar com isso, era
prejudicado e estereotipado como exemplo de fracasso escolar. No final da
dissertao, questionei que escola poderia abarcar essa diferena de
concepo que o prprio aluno responde no seu processo de escolarizao.
Na poca, minha hiptese era a necessidade de uma escola diferente, que
partisse da heterogeneidade para constituir seu trabalho educacional.
b. A EMEF Amorim Lima uma escola pblica.
Em considerao minha formao escolar (Infantil, Fundamentai I,
Fundamental II, Graduao, Mestrado e Doutorado) e maior parte da
experincia profissional em instituio pblica (Secretaria da Educao do
Estado de So Paulo), considerei-me responsvel por fornecer um retorno
intelectual a uma instituio pblica de ensino.
c. A EMEF Amorim Lima prope uma educao com base na liberdade.
A partir do momento em que a equipe da EMEF Amorim Lima percebeu que
precisaria ressignificar o espao escolar pelo fato de as demandas sociais e
profissionais atuais no corresponderem realidade na qual estamos
12
MANFRIM, A. M. P. Enunciados escritos: relaes dialgicas entre gneros discursivos. Dissertao de Mestrado. IEL-Unicamp, 26/06/2006.
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18
inseridos, a ideia de liberdade no processo de escolarizao muito presente
no discurso sobre a prpria escola.
Uma vez estipuladas as principais razes da escolha deste lugar de
pesquisa, pretendi lidar com os seguintes questionamentos:
Em que sentido a EMEF Amorim Lima constitui e materializa a liberdade?
Como se d a proposta de lidar com a heterogeneidade no que se refere
interao no convencional em um ambiente historicamente convencional,
escolar?
Por que, para a configurao de sua proposta, torna-se fundamental o
trabalho predominantemente em grupos?
Como o trabalho com a lngua materna tratado?
O que uma anlise mais detalhada das prticas de letramento existentes
nesta escola pode mostrar frente ao discurso que apresenta sobre si
mesma?
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19
A EMEF Desembargador Amorim Lima
Os trs trabalhos acadmicos encontrados em minha pesquisa sobre a
EMEF Amorim Lima (FERRARI, 2007; HAMED, 2006 e SABBA, 2010), apesar de
analisarem esta escola a partir de recortes diferentes, compreendem-na como um
ambiente educacional que se distancia de algumas dificuldades que as escolas
chamadas convencionais enfrentam, principalmente na relao entre contedos e
realidade dos alunos, e tentam concretizar alteraes no espao e tempo dos
professores, alunos e funcionrios para marcar que algo diferente j est sendo
realizado, justamente porque a equipe que coordena a escola no est de acordo
com o que se concebe como tradicional ou formal no que se refere ao ensino.
Ferrari (2007) coloca como ponto central de reflexo a
interdisciplinaridade e suas implicaes quando se assume a importncia deste
conceito no segundo ciclo do Ensino Fundamental. No que se refere EMEF
Amorim Lima, a autora defende que, dentre as trs escolas analisadas (uma
municipal no caso a Amorim Lima , uma estadual e uma de aplicao) esta a
escola que mais se enquadra em uma tentativa de desenvolvimento de um
trabalho interdisciplinar porque, devido ao interesse pelas inovaes
principalmente no tocante s mobilizaes dos tempos e dos espaos trazidas
pela Escola da Ponte13 e a proximidade entre educadores e comunidade escolar,
desenvolveram-se aes que aproximaram os temas escolares (materializados
pelos temas dos roteiros e as atividades culturais) realidade extraescolar se
13
A Escola Bsica da Ponte situa-se em S. Tom de Negrelos, concelho de Santo Tirso, distrito do Porto. A Escola Bsica da Ponte uma escola com prticas educativas que se afastam do modelo tradicional. Est organizada segundo uma lgica de projeto e de equipa, estruturando-se a partir das interaes entre os seus membros. A sua estrutura organizativa, desde o espao, ao tempo e ao modo de aprender exige uma maior participao dos alunos tendo como intencionalidade a participao efetiva destes em conjunto com os orientadores educativos, no planeamento das atividades, na sua aprendizagem e na avaliao.No existem salas de aula, no sentido tradicional, mas sim espaos de trabalho, onde so disponibilizados diversos recursos, como: livros, dicionrios, gramticas, internet, vdeos ou seja, vrias fontes de conhecimento.Este projeto, assente em valores como a Solidariedade e a Democraticidade, orienta-se por vrios princpios que levaram criao de uma grande diversidade de dispositivos pedaggicos que, no seu conjunto, comportam uma dinmica de trabalho e promovem uma autonomia responsvel e solidria, exercitando permanentemente o uso da palavra como instrumento autnomo da cidadania.(Fonte: http://beta.escoladaponte.com.pt/ponte/projeto).
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comparada com as outras duas escolas, consideradas pela autora como ainda
muito arraigadas ao paradigma tradicional de ensino caracterizado pela
fragmentao disciplinar e pela rigidez de tempos e espaos educativos (p. 251).
Hamed (2006), ao ter como centro dos estudos o trabalho que se
realiza com o teatro na EMEF Amorim Lima para consolidar o carter democrtico
da escola, defende que, por meio do trabalho realizado com esta arte dramtica,
esta escola vivencia concretamente uma escola democrtica, mesmo com
problemas (de obteno de recursos, de organizao e de aproveitamento dos
temas tratados nas peas, por exemplo) porque contribui para que os alunos se
conscientizem da realidade em que vivem.
Sabba (2010), apesar de centrar seus estudos na rea de matemtica,
centra suas reflexes na questo da aprendizagem que ultrapasse o limite do que
se compreende como escolarizado. Traz reflexes sobre a teoria da mente que
consideram a compreenso do mundo atrelado aos objetos e as reaes a eles,
sempre levando em considerao o que de fato ser humano. Para esta autora, a
EMEF Amorim Lima proporciona abertura para o novo, favorece a constituio de
subjetividades e deixa o aluno livre para escolher por onde comear a sua
aprendizagem, mostrando que, assim, coloca o aluno frente a frente com seu
processo de aprender, com os outros, com o meio ambiente, com a arte e com as
cincias.
Apesar de interpretarem a EMEF Amorim Lima como um espao
diferenciado a respeito da disponibilizao dos contedos, conscientizao pelo
teatro e a liberdade de escolha de incio do programa de estudos, essas
caractersticas no abarcam a completude de todo o espao escolar. No primeiro
caso, a anlise se pauta em um conceito (interdisciplinaridade); no segundo, em
um trabalho fora do espao em que os alunos permanecem o maior tempo na
escola (os sales) e o terceiro focaliza uma liberdade que tambm restrita, j
que as tarefas de matemtica e as oficinas esto intrinsecamente ligadas com as
outras atividades da escola porque fazem parte dos roteiros temticos de estudos.
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21
A ttulo de esclarecimento da dinmica desta escola para compreender
o porqu dessas reflexes realizadas nessas trs pesquisas ainda serem pouco
esclarecedoras aos objetivos de minha tese, segue, neste captulo, uma descrio
interpretativa da EMEF Amorim Lima.
A escola faz parte da rede municipal de ensino da cidade de So Paulo
desde 1956 e se localiza no Bairro Butant, muito prxima da Universidade de
So Paulo (USP-Porto 3). No perodo de 2010, ano em que a pesquisa de campo
foi realizada, era composta por 325 alunos de Ensino Fundamental II (149 que
estudavam no perodo da manh e 176 no perodo da tarde), 47 professores e 12
funcionrios administrativos. Funciona s nesses dois perodos, atendendo alunos
de diversos bairros. Oferece o Ensino Bsico (Fundamental I e II).
A equipe de direo da Amorim Lima administra a escola h um certo
tempo (desde 1996), o que garante certa continuidade dos projetos de trabalho
proposta por ela. A. E. a diretora atual e acompanhou todo o processo de
alterao da dinmica escolar quando foi decidido que a escola modificar-se-ia. A
chegada de G. T. na escola em 2004 como estudante de graduao em Letras da
USP, a partir de uma solicitao de estgio, contribuiu para a viabilizao das
alteraes que decidiram realizar na poca (2005).
A leitura que fao a respeito deste momento de transio na Amorim
Lima a de que houve grande aposta para esta demanda na relao entre Ensino
e Pesquisa devido formao do corpo docente e direo em que a maioria fez a
ps-graduao. pesquisa, coube um olhar analtico exotpico14 no qual
possibilita enxergar a dinmica da realidade escolar de maneira complexa e
abrangente. Ao ensino, coube o olhar de dentro, da experincia, aquele cheio de
14
Refiro-me aqui ao conceito de exotopia utilizado por Bakhtin (1979) para identificar, na relao entre o autor e o heroi, uma forma de compreenso dialgica a respeito da forma como se constitui o romance que ele chama de polifnico quando estuda os romances de Dostoivski. Para Bakhtin (ibidem), a exotopia o olhar de fora que tenta delinear um acabamento, mesmo que provisrio, a algo que se quer compreender. No caso do romance polifnico, a exotopia do autor em relao ao heroi vai se constituindo na prpria consolidao do romance e no previamente. Trouxe esta reflexo para a questo das caractersticas da pesquisa para mostrar que um dos olhares de fora elegidos pelos profissionais da escola, na constituio de um discurso da liberdade, vem da viso do olhar cientfico experienciado pelos professores, direo e estagirio.
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22
implcitos e especificidades dos momentos de interao entre os envolvidos no
processo de ensino e aprendizagem.
A partir desta minha leitura, considero que a escola sentiu necessidade
de compreender mais profundamente sua prpria realidade por meio do interesse
de quem realmente estava inserido nela, isto , pelos prprios profissionais.
Diante de esta metarreflexo sobre si mesma enquanto instituio, um elo
intermediou a relao entre ensino e pesquisa: o papel de lugar educacional
privilegiado para tratar da herana cultural.
Aps muitas discusses em reunies de professores na escola,
chegou-se concluso de que precisavam, alm de mobilizar o conhecimento e
experincia que adquiriram durante o trabalho docente, uma assessoria externa
que auxiliasse a repensar o trabalho realizado na escola. Nesse contexto, o
prprio trabalho do professor foi altamente discutido e o ponto comum verificado
era o de que o aluno deveria ser preparado para a vida e se assumir enquanto
participante fundamental para seu prprio processo de aprendizagem.
As grandes linhas pedaggicas do Projeto so absolutamente consonantes com aquelas que os Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) indicam como objetivo a se esperar dos alunos do ensino fundamental, e cuja importncia justifica reiterar:
compreender a cidadania como participao social e poltica, assim como exerccio de direitos e deveres polticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperao e repdio s injustias, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito;
posicionar-se de maneira crtica, responsvel e construtiva nas diferentes situaes sociais, utilizando o dilogo como forma de mediar conflitos e de tomar decises coletivas;
conhecer caractersticas fundamentais do Brasil nas dimenses sociais, materiais e culturais como meio para construir progressivamente a noo de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertinncia ao Pas;
conhecer e valorizar a pluralidade do patrimnio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e naes, posicionando-se contra qualquer discriminao baseada em diferenas culturais, de classe social, de crenas, de sexo, de etnia ou outras caractersticas individuais e sociais;
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23
perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente, identificando seus elementos e as interaes entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente;
desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiana em suas capacidades afetiva, fsica, cognitiva, tica, esttica, de inter-relao pessoal e de insero social, para agir com perseverana na busca de conhecimento e no exerccio da cidadania;
conhecer e cuidar do prprio corpo, valorizando e adotando hbitos saudveis como um dos aspectos bsicos da qualidade de vida e agindo com responsabilidade em relao sua sade e sade coletiva;
utilizar as diferentes linguagens _ verbal, matemtica, grfica, plstica e corporal _ como meio para produzir, expressar e comunicar suas idias, interpretar e usufruir das produes culturais, em contextos pblicos e privados, atendendo a diferentes intenes e situaes de comunicao;
saber utilizar diferentes fontes de informao e recursos tecnolgicos para adquirir e construir conhecimentos;
questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolv-los, utilizando para isso o pensamento lgico, a criatividade, a intuio, a capacidade de anlise crtica, selecionando procedimentos e verificando sua adequao. (Trecho do Projeto Poltico Pedaggico da EMEF Amorim Lima)
Rosely Sayo foi o nome escolhido para assessorar a escola
pedagogicamente. Participou de encontros com a equipe escolar (direo,
professores e pais de alunos) e apresentou vrios tipos de pedagogias
existentes em outras escolas. Uma delas foi o trabalho desenvolvido pela Escola
da Ponte o qual a equipe acreditou se encaixar nas expectativas que almejavam.
Iniciou-se, assim, um trabalho de investigao (j que o vis acadmico
forte na equipe) e anlise mais profunda da dinmica da Escola da Ponte. Jos
Pacheco foi convidado a prestar assessoria na escola e aceitou. Foi nesse
momento que a parceria entre Escola da Ponte e Escola Amorim Lima se
consolidou. Interessante notar que a busca desta escola municipal de So Paulo
baseava-se em responder, enquanto instituio pblica, s demandas dos alunos
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24
que ela atende e, tambm, importncia dada pelo grupo escolar aos estudos
cientficos.
Essa preocupao em manter o elo entre Ensino e Pesquisa por meio
do recurso da problematizao, investigao e busca de solues discutida por
Bourdieu (2004 [1997]) quando este autor discute os usos sociais da cincia.
Para ele, no h uma ligao direta entre o fazer cientfico e as
demandas sociais porque, primeiramente, a cincia trabalha para reproduzir a sua
prpria posio e poder na sociedade. Esse princpio inicial faz com que a
academia, em suas prticas objetivas, construa mecanismos que reforcem esse
lugar de prestgio.
Devido a essa realidade que ele identifica na esfera acadmica,
Bourdieu prope o conceito de campo para auxiliar na compreenso da dinmica
das relaes entre cincia e sociedade. O campo seria, ento, o lugar onde se
constituem as materialidades das relaes de reproduo da dinmica social e do
poder da cincia na sociedade. Inseridos em campos especficos (a matemtica, a
lingustica, a medicina, a literatura, a sociologia etc.) os pesquisadores, as
agncias de fomento, os congressos, os departamentos e os professores,
dependendo da posio que ocupam no campo, vo constituindo as formas de
socializao, tratamento do conhecimento e proteo de cada de cada um deles
necessrios para a permanncia e a importncia na esfera acadmica.
Por possuir essa dinmica, a cincia no necessariamente responde s
demandas sociais dos espaos fora da academia. Entretanto, a justificativa da
demanda social forte quando se trata de identificar as contribuies da cincia
para a humanidade.
Em que a ideia de campo pode contribuir para refletirmos a respeito
da EMEF Amorim Lima, quando resolve recorrer a respostas acadmicas para
viabilizar a constatao de que a escola, tal como se encontrava, no respondia
s demandas sociais, ou seja, realidade dos alunos que possua?
O caminho para esta resposta pode ser discutido conforme a quem os
profissionais desta escola se propem a atender e quais so as reais expectativas.
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Na posio que se encontravam, na qual j haviam identificado necessidade de
que a estrutura panptica15, da escola, as estratgias de viabilizao de uma
escola coloque em prtica uma dinmica escolar que valorize a liberdade deveria
lidar com 3 agrupamentos da comunidade diretamente associada a ela: a
prefeitura de So Paulo (instituio mantenedora), os profissionais envolvidos (os
agentes16 concretizadores da liberdade proposta: professores e assessoria) e o
pblico atendido (os agentes facilitadores da nova estrutura proposta: pais e
alunos).
No que se refere prefeitura de So Paulo, mantenedora que responde
diretamente esfera governamental, na qual a burocracia valorizada e
constituidora17, a EMEF Amorim Lima deveria responder exigncia do uso do
material didtico disponibilizado, ao cumprimento das exigncias nacionais dos
parmetros curriculares e correspondncia da expectativa dos ndices de
rendimento almejados por esta instituio. Diante desta demanda, a deciso do
grupo foi manter o livro didtico oferecido pela prefeitura, iniciar a prtica de
registros do que seria realizado na escola (documento de autonomia, relatrios,
projetos, atas etc.) e se comprometer a atender aos ndices esperados nas
avaliaes institucionais.
Em relao aos profissionais envolvidos, com experincias de formao
e de trabalho heterogneas, porm com o ponto comum da necessidade de
15
Estrutura da arquitetura estudada por Foucault para mostrar como os mecanismos de controle e vigilncia da sociedade podem ser representados pelas prprias construes dos prdios das instituies. "induzir no detido um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento autoritrio do poder." (FOUCAULT, 1997, p.166). Utilizo aqui este conceito porque a prpria escola se vale dele para se descrever: A sala da diretoria deixou de ser o panptico de uma instituio totalizante, a ameaa ao aluno desviante, para, sempre de portas abertas, ser o epicentro de uma transformao radical. (Projeto Poltico Pedaggico da escola. Disponvel em: http://antigo.amorimlima.org.br/tiki-index.php?page=Projeto%20Pol%C3%ADtico%20Pedag%C3%B3gico) 16
No estruturalismo no se constroem mitos, mas sim cincia. A anlise sincrnica estruturalista acaba abolindo a histria em pro) da estrutura. Para transpor o estruturalismo, Bourdieu faz uso do conceito de agente. Ele rompe com a negao do sujeito inserindo a idia de que o homem deve ser entendido como agente. Na filosofia do sujeito, este concebido como um ser esttico, fora do jogo de interesses do campo. A superao de Bourdieu a esta conceituao da filosofia do sujeito d-se na medida em que indivduos ou coletividades, pessoas, classes, ou instituies, disputam entre si alguma coisa de interesse comum. Bourdieu trabalha com agentes e no com sujeitos, j que agente o ser que age e luta dentro do campo de interesses. (MOCELIN, 2010) 17
A estratgia das organizaes pblicas frequentemente limitada pela burocracia que cerca os processos relacionados organizao. (ALMEIDA; CRUZ, s/d)
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26
mudana, tornou-se necessrio um fio condutor para garantir a viabilidade desta
demanda. Sobre este ponto, sugiro a interpretao de que a crena na validade da
cincia e das pesquisas na rea da educao acabou configurando este fio. As
relaes do sujeito com o conhecimento e o papel do professor comearam a ser
altamente discutidos. A questo da liberdade passou a direcionar os consensos e
dissensos entre esses profissionais e, ento, as concepes de educao,
aprendizagem e escolarizao foi delineando a forma de trabalho. importante
ressaltar aqui que este processo de reflexo passa fortemente pelas discusses
tericas tratadas na esfera cientfica, esfera esta a qual esses profissionais
tiveram formao e atuao18. Assim, a partir desta demanda a cincia enquanto
fio condutor norteia tanto a teoria quanto a prtica do trabalho nesta escola. Nesse
sentido, a estratgia de reforo e manuteno das escolhas relacionadas
construo da escola como espao de liberdade baseada na argumentao e na
identificao de justificativas para as atitudes tomadas para a dinmica escolar.
Considerando o pblico atendido, a escola, por se situar no bairro
Butant, prximo USP, possui alunos filhos de professores e funcionrios desta
universidade e, ainda, alunos das favelas mais prximas, que tambm valorizam a
o discurso acadmico. Alm desse discurso como elemento de reforo que acaba
atendendo s necessidades intelectuais dos pais e responsveis, existe a
resposta a uma exigncia da maioria dos alunos de interagir de forma diferente
com a escola. Dentro dos horrios e dos temas a serem abordados, os alunos
podem decidir por onde comear a estudar, realizam tarefas escolares na maior
parte do tempo em grupos, convivem no mesmo espao (salo de estudos e no
sala de aula) que o restante dos alunos do perodo, cuidam do seu processo de
cumprimento das tarefas, planejam e elaboram suas dinmicas de estudos e
possuem acesso direto direo da escola.
Ao tentar compreender, ento, ao que a escola enquanto instituio
quis responder quando decidiu modificar sua estrutura de funcionamento,
18
Durante a pesquisa de campo, todos os professores da equipe cursaram ou estavam cursando o mestrado em suas respectivas reas.
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27
possvel que a ideia de campo auxilie porque o que ocorreu foi a tentativa de
escolher outro caminho, diferente das concepes consideradas tradicionais ou
convencionais, elegendo, assim, o que seria vivel nesse contexto.
Retomando a ideia de campo de Bourdieu (2004 [1997]),
[Qualquer que seja o campo, ele objeto de luta tanto em sua representao quanto em sua realidade. A diferena maior entre um campo e um jogo que o campo um jogo no qual as regras do jogo esto elas prprias postas em jogo (como se v todas as vezes que uma revoluo simblica aquela operada por Manet, por exemplo vem redefinir as prprias condies de acesso ao jogo, isto , as propriedades que a funcionam como capital e do poder sobre o jogo e sobre os outros jogadores. (p. 29)]
possvel pensar que na prpria condio de intermediao entre governo,
cincia e sociedade a escola se constituiu como um campo, ou seja, um objeto de
disputa a partir de mecanismos que, como citado anteriormente, atendem ao que
se espera e, quando surge uma possvel dvida a respeito de sua veracidade, a
escola recorre ao registro, ou seja, burocracia e escrita como prova de
seriedade e de condio de se constituir enquanto escola.
Uma vez ocupando a posio de campo, semelhante a um campo
cientfico, elegem-se maneiras de luta por meio dele, ou melhor, estipulam-se
condies mnimas de considerao de uma possvel dissonncia com a dinmica
de funcionamento criada e consolidada do prprio campo. Para Bourdieu19,
existem lutas externas e internas a um campo e, nelas, o intuito sempre garantir
a permanncia do mesmo.
No caso da EMEF Amorim Lima, as lutas internas, aquelas nas quais se
disputam lugares estratgicos no campo para contribuir ao seu direcionamento,
configuraram-se por meio do encontro entre professores que j lecionavam na
escola, juntamente com a diretora, e o estagirio de graduao em Letras da USP
que buscou, na escola, um lugar para realizar seu estgio docente. O
envolvimento deste estagirio com as perspectivas de transformao da escola foi
19
Op.cit.
-
28
to intenso que este assumiu um lugar importantssimo, consolidando-se como um
agente fundamental de transformao na dinmica da escola.
G. T. percebeu, a comear por sua prpria formao docente, que os
conhecimentos tratados, juntamente com os conhecimentos das formaes dos
professores j atuantes na escola, no eram suficientes para promover
transformao da escola que tanto acreditava ser necessria. Por isso, comeou a
buscar o que se discutia de mais atual em relao ao ensino e a aprendizagem.
Simultaneamente com a assessoria de Rosely Sayo, G. T. matriculou-
se na disciplina da ps-graduao em Lingustica Aplicada (LAEL-PUC-SP) sobre
elaborao de material didtico oferecido pela professora Roxane Rojo, ento
professora da PUC-SP. A partir das discusses tericas e prticas desta
disciplina, G. T. comeou a pensar no material didtico que seria adequado
realidade da Amorim Lima. Identificou a impossibilidade de se refazer todo o
material didtico da escola e decidiu, a partir de discusses levadas nas reunies
de professores, elaborar Roteiros de Estudos20 interdisciplinares cuja fonte
principal seria o Livro Didtico fornecido pela prefeitura de So Paulo.
Enquanto G. T. cuidava dos Roteiros de Estudos, Jos Pacheco
prestava assessoria em diversos aspectos da escola, com destaque aos
estruturais. As paredes das salas de aula foram derrubadas e, no lugar delas,
formou-se um salo de estudos onde todos os alunos do perodo cumpririam seus
Roteiros no interior deste salo e, somente nas aulas de Educao Fsica,
Oficinas de Portugus e aula de Artes, sairiam deste espao.
Os professores da escola, tanto efetivos como no efetivos, cumprem
seus horrios de aula oferecendo, principalmente, assessoria no salo de estudos.
Neste espao no existem aulas expositivas. Os professores so solicitados pelos
alunos para esclarecimentos do Roteiro de Estudos que esses alunos possuem
dvida. Caso contrrio, esses profissionais no so requisitados. Efetiva-se a
atuao do professor polivalente.
20
Roteiros organizados por temas compostos por diversas tarefas a serem realizadas. Essas tarefas baseiam-se principalmente nos contedos dos Livros Didticos disponveis na escola. Um exemplo de Roteiro de Estudo est disponvel no Quadro 2 desta tese.
-
29
Anualmente, alm da assessoria no salo, cada professor orientador
de, em mdia, 30 alunos para acompanhar, a cada quinzena, o andamento da
elaborao dos Roteiros por eles. Nessa orientao, o professor verifica em que
roteiro os alunos esto, quais as dificuldades, qual o tempo de finalizao do
roteiro e, por fim, o planejamento dos prximos roteiros que cada aluno escolher
fazer. O objetivo das orientaes reforar que cada aluno, dependendo de sua
idade (e no da srie), deve cumprir uma quantidade especfica de roteiros no
ano, no importando a ordem.
Configurado o espao interno, as lutas externas para a permanncia da
dinmica da escola (do campo) acontecem no mbito das trs configuraes da
comunidade diretamente envolvida com a escola citadas anteriormente (governo,
formao acadmica e sociedade), por meio da reflexo intelectual que delineei
aqui como um uso social da cincia. A luta externa acaba sendo desafiadora e
constante no cotidiano da escola porque esta instituio se props a desestabilizar
representaes de escola at ento confortveis: a relao com o conhecimento,
o papel do professor e a preparao dos alunos para o Ensino Mdio, j que a
Amorim Lima uma escola de Ensino Fundamental.
Por meio dos Roteiros de Estudos, os alunos acessam o Livro Didtico,
lendo e respondendo tarefa solicitada, sem aulas expositivas. Na conversa
gravada com G. T. para esta tese de doutorado, ele prope a reflexo de qual
seria o papel do Ensino Fundamental:
Os professores no possuem mais lousa para ensinar. Eles se movimentam pelo ptio para orientar os alunos, caso haja dvidas, direcionam o planejamento de elaborao dos roteiros com os alunos a cada quinzena e cuidam do comportamento dos alunos no interior do salo de estudos.
Devido ao fato de os alunos no participarem de situaes de prova tal
como a conhecemos (apesar de responderem a questes do livro didtico quando
realizam o roteiro), a escola muito questionada neste ponto por meio de 2
perguntas: 1) Como os alunos lidaro com o trabalho conteudista e explicativo do
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30
Ensino Mdio? e 2) Como os alunos lidaro com os exames nacionais e
vestibulares?
Esses dois principais questionamentos so preocupaes que
perpassam as trs instncias mencionadas e, apesar de, mascaradamente,
parecer uma demanda social genrica, faz parte da disputa externa de reforo e
permanncia de conhecimentos e valores privilegiados na disputa do prprio
campo (ou disciplina acadmica) educacional. Dessa maneira, a ideia de campo
contribui para, inclusive, entendermos o porqu uma escola que se pretende ser
mais livre das demais existe e em que lugar ela se situa para possibilitar a
manuteno desta nova configurao.
Por meio da possibilidade de se construir, por meio das frestas dos
discursos dominantes, um espao diferenciado e ao mesmo tempo justificado pelo
cotejamento de interesses comuns entre as instncias que possibilitam sua
existncia, efetivou-se um (auto)discurso norteador que reforou a prpria
existncia da EMEF Amorim Lima tal como ela hoje.
Este discurso nesta instituio atendeu a demandas internas da prpria
constituio deste campo, reforando a prtica do cotidiano escolar da Amorim
Lima. Os agendes modificadores pertencentes tanto configurao deste discurso
quanto atuao na escola concretizaram a nova dinmica escolar neste espao.
H, assim, um (auto)discurso sobre a EMEF Amorim Lima
representativo, divulgado tambm nos documentos oficiais da escola:
Preocupada com a alta evaso _ e ciente do triste fim que vinham a ter os alunos evadidos visto que, para muitos, era a escola o nico vnculo social concreto _ o primeiro esforo da nova diretoria foi no sentido de manter os alunos na escola, durante o maior tempo possvel. Foi o tempo de derrubar os alambrados que cerceavam a circulao no ptio, num voto de respeito e confiana, de abrir a escola nos fins de semana, de melhorar os espaos tornando-os agradveis e voltados convivncia. De abrir, enfim, a escola comunidade. A sala da diretoria deixou de ser o panptico de uma instituio totalizante, a ameaa ao aluno desviante, para, sempre de portas abertas, ser o epicentro de uma transformao radical. Alunos de sries mais avanadas comearam a freqentar e viver a escola
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31
fora de seus horrios de aula, como monitores em atividades vrias. Com apoio e o engajamento crescente dos pais e mes de alunos e da comunidade, a escola passou a oferecer atividades extracurriculares. Instalaram-se Oficinas de Cultura Brasileira, de Capoeira, de Educao Ambiental, de Teatro. A maior participao dos pais e mes passou a se refletir na organizao das festas (Festa Junina, Festa da Cultura Brasileira, em agosto, Festa do Auto de Natal, com a colaborao de Conceio Acioli e Lydia Hortlio), na criao do Grupo de Teatro de Mes, no trabalho voluntrio. O Instituto Pichn-Riviere? e o Instituto Veredas foram convidados a fazer intervenes na escola. Conseguiu-se apoio financeiro externo para uma srie de atividades _ primeiro do Projeto Crer para Ver, da Fundao Abrinq, por dois anos, e depois da Fundao Camargo Correia21.
Atualmente, a EMEF Amorim Lima um prdio de trs andares, com
um espao interno grande e um externo bem maior. Na rea externa, h, na
entrada dos alunos, um jardim com flores coloridas e hortalias utilizadas para
tempero, as quadras de basquete e vlei, um espao coberto para as aulas de
capoeira e um espao no qual alguns indgenas construram uma oca e um forno
de barro quando passaram uma temporada na escola conversando com os alunos
sobre o modo de vida deles na comunidade indgena que viviam no Acre.
Na rea interna, no primeiro andar, h, no sentido exterior-interior, um
hall com uma maquete da escola, cadeiras e plantas nos vasos, local utilizado
para espera ou como espao para bazares. Ainda neste sentido fora-dentro,
esquerda deste hall encontram-se a secretaria, a sala dos professores, a sala de
aula de alfabetizao, a sala da direo, o sanitrio, a sala em que se guardam
materiais e outra sala para reunio.
direita da rea interna inicial h um corredor com abertura para duas
salas ( esquerda): a sala de informtica e a sala Jos Pacheco, utilizada para
guardar material de educao fsica e para palestras e cursos, quando h. Depois
do corredor, h a rea de convivncia coletiva que consiste em um salo
retangular grande e, em uma de suas paredes, esto escritos os princpios de
convivncia da escola. So eles:
21
Projeto Pedaggico da EMEF Amorim Lima. Disponvel em: http://www.amorimlima.org.br/tiki-index.php?page=Projeto%20Pol%C3%ADtico%20Pedag%C3%B3gico. Data de acesso: 16/10/2011.
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Todos merecemos ser tratados com respeito Todos devem saber ouvir e saber falar.
Todos devem levantar a mo para pedir a palavra. Ningum deve sofrer ameaas.
Ningum deve receber apelidos desrespeitosos. Ningum deve ser xingado ou ofendido.
Todos temos direito a uma escola tranqila, limpa e organizada Todos devem cuidar das plantas e do jardim.
Todos devem se esforar para manter os banheiros limpos. Todos devem jogar o lixo nos cestos. Ningum deve correr nos corredores.
Ningum deve pular os muros da escola. Todos devem ter calma, para que no haja brigas.
No devemos pichar ou rabiscar as paredes e muros. Na escola no devemos falar palavres. Todos temos que levar a escola a srio
Ningum deve cabular as aulas. Os horrios devem ser respeitados por todos.
Todos devem vir escola com roupas adequadas. No devemos mascar chicletes nas aulas.
No devemos fumar na escola. Todos temos direito a materiais de estudo e livros limpos e bem conservados
No devemos rabiscar as carteiras. Devemos cuidar dos livros e dos outros materiais de uso coletivo, no rabiscando ou
rasgando. Devemos respeitar os materiais dos outros, no roubando ou mexendo em mochilas sem
autorizao. S devemos trazer para a escola os materiais que vamos usar para estudar e dos quais
poderemos cuidar. No devemos trazer MP3, e celular s se for muito necessrio. Devemos ser solidrios e emprestar nossos materiais, que devem ser bem cuidados e
devolvidos aps o uso. Todos temos direito a fazer as refeies em local limpo e tranqilo
Devemos nos servir somente da quantidade que pretendemos comer, para no desperdiar comida.
No devemos brincar com a comida, nem jog-la no cho ou nos outros. Todos devem respeitar a fila para pegar os pratos.
No devemos comer em locais inadequados. Todos temos direito a uma escola que funcione organizadamente
Os horrios das atividades devem ser definidos e respeitados. Todos os roteiros e trabalhos dos alunos devem ser corrigidos.
O nmero de educadores deve ser suficiente. Quadro 01: Princpios de Convivncia estipulados na Amorim Lima
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No mesmo direcionamento, aps este espao encontram-se o refeitrio,
a biblioteca e, finalizando a disposio interna do trreo da escola, duas salas de
artes.
No segundo andar, acima da rea de convivncia coletiva, do refeitrio,
da biblioteca e das salas de artes, h o Salo de Estudos (Salo 1) dos alunos do
Fundamental I. Neste andar tambm h duas salas de aula pequenas,
normalmente utilizadas para oficinas e tutorias. Neste salo, todos os alunos
pertencentes ao Fundamental I, cumprem seus roteiros, com exceo dos alunos
que esto sendo alfabetizados.
No terceiro andar, da mesma forma que no segundo, existem trs
espaos: duas salas de aula pequenas para oficinas e tutorias e o chamado Salo
2 onde os alunos do Fundamental II cumprem seus roteiros.
Tanto no Salo 1 quanto no Salo 2 existem mesas redondas e
quadradas que proporcionam sempre o cumprimento dos roteiros em grupos. Isso
no significa que o grupo de alunos que senta da mesma mesa cumpra o mesmo
roteiro (normalmente isso no acontece). Cada aluno escolhe o roteiro que quer
cumprir e o faz independente do colega.
Segue um exemplo de um roteiro que um aluno deve cumprir:
ROTEIRO DE PESQUISA: LEITORES
Estudante: Grupo:
Objetivos Atividades Avaliao Prof. / Tutor
1. Ler diferentes textos sobre o tema criatividade. Port 8, p. 10-12(Ex. 1-3)
2. Estudar as caractersticas de um texto narrativo.
Port 8, p. 13-14(ex.1-5).
3. Estudar as caractersticas de um texto descritivo.
Port 8, p. 16(ex.1-5)
4. Estudar as caractersticas de um texto Port 8, p. 17-18(ex.1-
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34
argumentativo. 6)
5. Estudar as caractersticas de um texto explicativo.
Port 8, p. 18-21(todos os exerccios).
6. Estudar as caractersticas de um texto conversacional.
Port 8, p. 22.
7. Ler o artigo de divulgao cientfica O que diz a letra, da revista Superinteressante.
Port 8, p. 23-26.
8. Pesquisar textos de diferentes gneros do discurso em jornais.
Port 8, p. 26-28(todos os exerccios).
9. Ler o texto Redao com estilo, que circulou na internet por e-mail. 10. Analisar anncios publicados em jornal.
Port 8, p. 29-30(ex.1-4). | | Port 8, p. 30-31.
Fonte: http://www.amorimlima.org.br/tiki-index.php?page=Leitores data de acesso: 16/10/2011
Observao: Este roteiro pertence ao tema designado pela prpria escola de Identidade e Alteridade, produzido para o Fundamental II. Cada aluno deve cumprir seu roteiro individualmente, mas burocraticamente pertence a um grupo que ser orientado por um dos professores da escola, no momento de tutoria, momento este em que o professor, no papel de tutor, auxilia o grupo de alunos no gerenciamento do cumprimento dos roteiros. O grupo de alunos se rene a cada quinzena para a tutoria.
Quadro 02: Exemplo de um Roteiro de Estudos da Amorim Lima
Os professores de todas as disciplinas permanecem nos sales para
tirar dvidas dos alunos em relao aos roteiros. Como j mencionei
anteriormente, quando o aluno tem dvida sinaliza levantando a mo e o professor
dirige-se mesa na qual o aluno est sentado e o auxilia.
H momentos em que os professores de matemtica e de portugus,
alm da tutoria, promovem oficinas de aprofundamento de questes especficas
como tpicos de gramtica, equaes de segundo grau etc. Nesse caso, cada
grupo de alunos possui, na semana, um horrio para frequentar essas oficinas e
vivenciam, em algumas delas, aulas expositivas.
Uma vez cumprido um roteiro, o aluno preenche, alm das tarefas
solicitadas por este roteiro no caderno, um portflio, tambm no caderno,
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registrando suas impresses pessoais relacionadas ao cumprimento do roteiro
finalizado. Depois disso, preenche uma Ficha de Finalizao do roteiro no mais
no caderno.
Essas fichas consistem em um documento, semelhante a uma prova,
no qual os alunos devem responder e entregar ao tutor. Normalmente quem
elabora essas fichas so os prprios tutores. Este material muito diversificado,
pois, alm de variar de tutor para tutor, o prprio formato e estilo de questes
variam conforme o tema geral do roteiro. Eis um exemplo de Ficha de Finalizao:
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Quadro 03: Exemplo de uma Ficha de Finalizao para o roteiro Leitores (5 pginas)
No que se refere organizao da sequncia dos roteiros realizados
pelos alunos, j que eles podem escolher por quais querem comear diante dos
roteiros estipulados a eles conforme a idade, os tutores responsveis pelo aluno
distribuem, a cada reunio quinzenal de tutoria, um Plano de Estudos e, neste
documento, o aluno registra o que realizaro na prxima quinzena. Diferente da
Ficha de Finalizao, este documento tem o mesmo formato para todos os alunos.
Segue a reproduo de um Plano de Estudos em branco:
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Quadro 04: Relatrio Quinzenal
Os livros didticos que servem como base de consulta na elaborao
dos roteiros so os fornecidos pela prefeitura. No ano de 2010 os utilizados no
Fundamental II, etapa da escolarizao foco desta pesquisa, eram:
Nome do livro didtico
Propsito
de
utilizao
Pblico
atendido
So Paulo. Cadernos de apoio e aprendizagem:
Lngua Portuguesa. Programas: Ler e escrever e
Orientaes Curriculares. So Paulo: Fundao
Padre Anchieta,
Oficinas de
Portugus 5, 6, 7 e 8
anos 2010 CEREJA, W. R. Portugus: linguagens. So
Paulo: Atual, 2009. 5 edio Roteiros
GARCIA, Ana Luiz Marcondes. Olhe a lngua! :
-
40
lngua portuguesa. So Paulo: FTD, 1999.
BORTOLOZZO, Silvia. Projeto educao para o
sculo XXI. (Srie link da cincia). So Paulo:
Moderna, 2002.
ANDRINI, lvaro. Novo Praticando Matemtica.
So Paulo: Editora do Brasil, 2002
GARCIA, Hlio Carlos. Geografia. So Paulo:
Scipione, 2002.
MONTELLATO, Andra Rodrigues Dias. Histria
temtica: tempos e culturas. So Paulo: Scipione,
2002.
TAKAZAKI, Helosa Harue. Linguagens no sculo
XXI: lngua portuguesa. So Paulo: IBEP, 2002.
Esquema 01: Lista dos livros a serem consultados para a realizao dos Roteiros de
Estudos na Amorim Lima
No que se refere organizao do tempo na escola, considerando que
esta instituio atende alunos no perodo da manh e da tarde, as atividades
curriculares referentes aos alunos que estudam pela manh (perodo em que
realizei a pesquisa de campo) foram configuradas da seguinte forma:
Atividades
ATIVIDADES CURRICULARES Atividades
extracurriculares Salo Oficina Educao
Fsica Tutoria
Tempo Todos
os dias
1 vez
por
semana
2 vezes na
semana
Quinzenal No
contraperodo
Esquema 02: Distribuio das atividades realizadas pelos alunos do Ensino Fundamental II
na EMEF Amorim Lima no ano letivo de 2010 para o perodo da manh.
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Realizada a descrio mais geral acima, f